Todos os anos o Eurostat publica um relatório acerca da situação da União Europeia (UE), de forma agregada e individual por Estado-membro, com uma visão geral acerca das estatísticas em três domínios temáticos: pessoas e sociedade, economia e negócios, e ambiente e recursos naturais.
Especificamente, no domínio do ambiente e recursos naturais, é considerada a análise das áreas de transporte, energia e ambiente, dada a dimensão dos seus impactes na esfera da sustentabilidade ambiental.
As estatísticas europeias são aqui apresentadas e complementadas com alguns fundamentos do Relatório de Estado do Ambiente (REA 2022), elaborado pela Agência Portuguesa do Ambiente (APA), o qual constitui uma sistematização da informação da evolução das políticas e medidas nacionais implementadas em matéria de ambiente e desenvolvimento sustentável, apresentando igualmente os respetivos resultados alcançados.
– Ambiente: resíduos e emissões
No que refere ao domínio do ambiente destacam-se dois tópicos principais e respetivos desafios associados: a gestão de recursos e a respetiva necessidade de melhoria da gestão de resíduos e; o clima e a necessidade de minimização das emissões de gases com efeitos de estufa (GEE).
No que refere aos fluxos específicos de resíduos, em Portugal, as taxas de reciclagem apuradas em 2020 estavam alinhadas com as metas globais definidas neste âmbito. No caso dos óleos lubrificantes, a meta anual situa-se nos 75%, tendo sido cumprida e ultrapassada (89%) em 2020 [1].
Relativamente aos resíduos, em 2021, na UE, cada habitante gerou cerca de 530 kg de resíduos urbanos, sendo que em Portugal, esse valor foi na ordem dos 513 kg por habitante (Figura 2) [2].
Em 2021, na UE, cerca de 234 milhões de toneladas de resíduos urbanos foram tratados, representando quase 99% dos resíduos urbanos gerados. A reciclagem de materiais representou cerca de 30% dos resíduos urbanos tratados na UE, enquanto a compostagem e digestão representou cerca de 19%. Em contraste, mais de um quarto dos resíduos urbanos tratados na UE foram incinerados com recuperação energética (26,7%) e sem recuperação energética (0,5%), e menos de um quarto (23,3%) foi encaminhado para aterro [2].
Em Portugal Continental, em 2021, a produção de resíduos urbanos foi cerca de 5,04 milhões de toneladas, um acréscimo de 0,6% em relação ao ano anterior [1]. No mesmo ano, as taxas de preparação para reutilização e reciclagem e de deposição em aterro situaram-se nos 33% e 54%, respetivamente, evidenciando que a deposição em aterro continua a ser o destino preferencial dos resíduos urbanos em Portugal, apesar da diminuição anual gradual a que se tem assistido [3]. Neste sentido, evidencia-se ainda um considerável grau de distância às principais metas e objetivos definidos neste âmbito para 2035, nomeadamente: alcançar 65% em peso relativamente à preparação para reutilização e reciclagem de resíduos urbanos face à produção e alcançar 10% de deposição de resíduos urbanos em aterro, face à produção [1].
Quanto às emissões de GEE na UE, em 2020, estas atingiram as 3.359 milhões de toneladas de CO2 equivalente, o que correspondeu a uma diminuição de 31,7% em comparação com os níveis de 1990, embora aqui se verifique os efeitos da crise de Covid-19. As principais fontes de emissões de GEE na UE referiram-se às indústrias de energia (quase 41% do total) e transportes (cerca de 23%, que inclui a aviação internacional). A única fonte que aumentou a quantidade de GEE entre 1990 e 2020 foram os transportes, com um crescimento total na ordem dos 6,8% [2].
Em Portugal, em 2020, as emissões totais de GEE, sem contabilização das emissões de uso do solo e florestas, foram na ordem das 57,6 Mt de CO2 equivalente, uma redução de cerca de 33% face a 2005 [1]. Em relação a este tópico, o PNEC 2030 define como objetivo, até 2030, de se alcançar a redução das emissões de GEE entre 45% e 55% face aos valores de 2005, o qual, por sua vez, está alinhado com os objetivos específicos de alcance da neutralidade carbónica definidos pelo RNC 2050 [1].
– Transportes
No domínio dos transportes uma das principais tendências é a descarbonização do setor através da promoção da utilização e melhoria das redes de transportes coletivos, assim como a promoção da mobilidade elétrica e utilização de combustíveis alternativos [1].
Relativamente ao parque automóvel, em 2020, na Europa registou-se uma taxa de 559 veículos de passageiros/1000 habitantes, um valor acima dos verificados em Portugal nos últimos anos, apesar da tendência crescente (Figura 3).
Do ponto de vista tecnológico, os novos carros fabricados utilizam motores mais eficientes com níveis de emissões mais baixos. Estes benefícios podem ser, de certa forma, maximizados se existir uma tendência para esta modernização tecnológica em veículos pesados ou com maior potência [2].
Tanto na UE como em Portugal, tem-se assistido ao crescimento da quota de veículos híbridos e elétricos em circulação [2]. Em Portugal, até setembro de 2023, foram registados 27.430 veículos elétricos (BEV), uma variação de 31,7% face ao período homólogo, com a grande maioria correspondendo a veículos ligeiros de passageiros (25.655), seguido dos ligeiros de mercadorias (1.775) [4, 5].
No que refere ao transporte de mercadorias, destaca-se a sua predominância por via rodoviária, seguido do modo ferroviário e do transporte em cursos de águas interiores (como rios, lagos e outros canais de águas interiores). Em 2021, 77,3% do transporte de mercadorias na UE foi feito por via rodoviária, 17% através de linha férrea e 5,6% por via de cursos de águas interiores [2]. Os resultados para Portugal (2020) foram ainda mais expressivos no transporte rodoviário de mercadorias, tendo representado 85,8% e o ferroviário cerca de 14,2%. De referir que a nível nacional estão definidos objetivos até 2030 (Plano Nacional Energia e Clima 2021-2030 e Livro Branco dos Transportes), que apontam para a transição de 30% do tráfego rodoviário de mercadorias em distâncias superiores a 300 km, para outros modos de transporte, como o ferroviário ou o marítimo/fluvial [1].
– Energia
No domínio da energia, a descarbonização e a promoção da eficiência energética estão entre os principais objetivos.
Em 2021, o consumo de energia final na UE situou-se na ordem dos 39.351 petajoules, um valor 6,2% superior ao valor registado em 2020. Os produtos petrolíferos contabilizaram mais de um terço (34,8%) do consumo final de energia da UE, com a eletricidade (22,8%) e o gás natural (22,6%) a registar quotas crescentes em relação aos anos anteriores [2]. Em Portugal, em 2021, o consumo de energia final aumentou 4,8%, relativamente a 2020, principalmente devido ao aumento do consumo de combustíveis rodoviários e no transporte aéreo, com a recuperação dos efeitos da pandemia de Covid-19 [1].
Quando comparado com 1990, o consumo europeu de energia registado em 2021 apresentou um aumento médio de 0,1%/ano. Durante este período (1990-2021) verificou-se uma mudança na estrutura de consumo de energia, transitando do consumo de energia elétrica a partir de combustíveis fósseis sólidos, incluindo carvão, gases manufaturados, turfa, xisto e areias betuminosas (decréscimo de 11,5% para 2,5%), para o consumo de energia elétrica a partir de fontes renováveis e biocombustíveis (incremento de 4,3% para 11,8%) [2].
No que se refere aos valores de consumo final de energia (Figura 4), em 2021, cerca de 22% do consumo final bruto de energia da UE provinha de fontes de energia renováveis, uma subida de aproximadamente 8% em comparação com os níveis da década anterior (14%). Em Portugal, em 2021, esse valor foi na ordem dos 34%, apresentando uma tendência favorável crescente e acima da média europeia [2].
De referir que, até 2030, as estratégias nacionais consagradas no Plano Nacional Energia e Clima 2021-2030 e no Roteiro para a Neutralidade Carbónica 2050, assinalam como um dos principais objetivos a incorporação de 47%s de energia de fontes de energia renováveis no consumo final bruto de energia.
Um dos principais desafios prende-se com a questão da dependência energética e com a sua redução. Em 2021, a taxa de dependência energética da UE correspondeu a praticamente 56% (Figura 5), ou seja, as importações brutas representaram mais de metade da energia disponível, sendo que nenhum dos Estados-membros era autossuficiente para responder às suas necessidades energéticas [2]. Em Portugal, no mesmo ano, registou-se um valor de dependência energética na ordem dos 67% [1].
Referências:
[1] Agência Portuguesa do Ambiente, I.P. (2023). Relatório do Estado do Ambiente 2022. Consultado em outubro 2023: https://rea.apambiente.pt/sites/default/files/rea/REA%202022_pdf_vfinal_21_07_2023.pdf
[2] Eurostat (2023). Key figures on Europe – 2023 edition. Consultado em outubro 2023: https://ec.europa.eu/eurostat/documents/15216629/17177791/KS-EI-23-001-EN-N.pdf/5df7a393-8461-9270-7eaa-91a4b1c2acc6?version=3.0&t=1695106289165
[3] Agência Portuguesa do Ambiente, I.P. (2022). Relatório Anual de Resíduos Urbanos. Consultado em outubro de 2023: https://apambiente.pt/sites/default/files/_Residuos/Producao_Gest%C3%A3o_Residuos/Dados%20RU/RARU_2021.pdf
[4] ACAP (2023). Mercado Automóvel em Portugal – Por tipo de energia em 2023. Consultado em outubro 2023: https://www.acap.pt/site/uploads/paginas/documentos/C8085CAB-7F0F0_1.pdf
[5] ACAP 2023. Matrículas de Automóveis Ligeiros de Passageiros em Portugal por tipo de energia – % de variação homóloga, setembro 2023. Consultado em outubro 2023: https://motordata.pt/autoinforma/chart_g6.php